quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

O legado Almeida

Cícero Almeida em 2004, após sua primeira vitória à prefeitura, e em 2012: alguns cabelos brancos, rugas e milhões de reais a mais


Em 31 de dezembro próximo, Maceió se despede de um dos mais populares e conturbados prefeitos que já passaram pela administração municipal. José Cícero Soares de Almeida, maribondense às portas de seus 55 anos, radialista, cantor de botequins, repórter policial e compositor de forrós populares, deixa a cadeira que esquentou durante oito anos para voltar a ser o mesmo cidadão comum de antes da meteórica carreira política, que o levou de vereador da capital a prefeito em intervalo de uma eleição.

Ciço, alcunha que lhe é dada tanto por críticos quanto por admiradores, passou seguramente por sua mais intensa e transformadora experiência. De um simples repórter policial da hora do almoço, especialista em extrair pequenas confissões de ladrões de galinha, converteu-se em prefeito de uma grande capital, desbancando figurões da política local – venceu em suas duas eleições, nada menos que candidatos apoiados por Ronaldo Lessa e Teotônio Vilela, então governadores do estado, e suas pesadas máquinas públicas.

Oito anos depois, a Maceió que Almeida deixa para seu sucessor, o tucano Rui Palmeira, é uma cidade atolada em problemas, alguns deles estampados com a triste conclusão de insolúveis. Ciço, o mais popular prefeito dos últimos tempos, não soube utilizar do forte apoio do maceioense para implementar as soluções que a cidade precisava. Aliás, Ciço não soube, em nenhuma área, utilizar-se do seu grande apelo popular. Confundiu por todo o mandato, popularidade com arrogância e autossuficiência.

Há um resultado pragmático e perverso dessa mistura. De sujeito quase simples, de classe média, fala-se que Ciço tem hoje uma das maiores fortunas de Alagoas, advinda logicamente de origens desconhecidas, e incompatíveis com um funcionário público de primeiro escalão, que ganha em torno de R$ 15 mil mensais. Especula-se que o prefeito seja dono de vários imóveis na orla marítima de Maceió, além de fazendas no interior de AL e em outros estados. Tudo, claro, em nome de terceiros, aula de malandragem que um gestor, ao tomar conta de uma caneta municipal, tem que aprender muito bem.

Despido do paletó de prefeito, caberá agora a Almeida defender-se dos processos criminais a ele imputados, que já se acumulam na justiça. O último lhe rendeu recentemente um natal, digamos, mais magro: seus bens foram bloqueados pela justiça federal, por conta de desvio de recursos públicos para compra de ambulâncias. É mais um imbróglio jurídico na sua conta, além do indiciamento na operação taturana, na qual é acusado de pertencer a ORCRIM do ex-deputado Celso Luís, e também com a chamada “máfia do lixo”, desvios de mais de R$ 300 milhões em contratos com empresas de coleta, da qual é considerado o chefe. Problemas que a partir de agora, como cidadão comum e desarmado de sua autossuficiência, terá que ter habilidade para se safar.

Na esfera administrativa, para além de seus apertos com a justiça, Almeida também não deixa para seu sucessor algum saldo positivo. Foram inúmeras trocas de secretariado e de perfis administrativos – algumas por pura birra do prefeito. Na saúde, Maceió tem a pior cobertura de PSF (Programa de Saúde da Família) entre todas as capitais brasileiras; os postos de saúde funcionam precariamente. Na educação, talvez o maior mérito da gestão Ciço tenha sido manter as escolas funcionando, diante do caos instalado na educação estadual. Na infra-estrutura, não teve competência suficiente para bancar soluções criativas para o trânsito caótico da cidade.

Enfim, não mudou a cara de Maceió. Não deixará nenhum legado de seus oito anos, nada acrescentou que o imortalizasse como grande gestor. Resta para Almeida, para que o julgamento da história o absolva, que consiga se defender do impossível e explique como era pobre e tornou-se rico.

Do contrário, os microfones das barracas da orla, onde cantarolava seus forrós de gosto duvidoso, serão o triste destino do prefeito eleito por mais de 319 mil maceioenses em 2008.

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